Empreendedorismo: Paixão, sim, mas com preparo
Empreendedorismo: Paixão, sim, mas com preparo
O país tem 37 milhões de empreendedores. Eles querem deixar a própria marca no mundo, não desistem no primeiro obstáculo e estão dispostos a arriscar. Contudo, precisam de qualificação.
O empreenderismo está ligado à paixão. Por uma ideia, por um objetivo de vida, pela vontade de deixar uma marca no mundo. Esse sentimento é o que leva um profissional experiente a abandonar o mercado de trabalho e a apostar em um negócio próprio, ou um jovem sem qualquer vivência em um emprego formal a arriscar e seguir o mesmo caminho. A prática é uma das melhores maneiras de se tornar um empresário de sucesso, mas buscar qualificação também é essencial para preencher lacunas e correr apenas riscos calculados. O país tem 37 milhões de empreendedores e outros 54 milhões de brasileiros desejam abrir uma empresa, de acordo com a pesquisa internacional Global Entrepreneurship Monitor (GEM), de 2012. Na primeira da série de reportagens sobre como criar uma empresa, o Correio mostra as habilidades necessárias para se tornar um empreendedor e de que forma desenvolvê-las.
Gilberto Sarfati, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), elenca as cinco principais características de um empreendedor: necessidade de realização e de independência, tendência criativa, determinação e disposição para correr riscos calculados. “Todas elas podem ser desenvolvidas, e o primeiro passo é adquirir conhecimento, por meio de cursos ou de leituras”, destaca. Depois de estudar e de aprimorar as habilidades que faltavam, chega o momento de testar esse conhecimento em uma situação prática, explica Sarfati, para avaliar o desempenho e aperfeiçoar o que for necessário.
Para Igor Fonseca, 26 anos, a descoberta da vocação para empreender veio depois que voltou de um intercâmbio na Austrália. Formado em educação física, antes de partir para a experiência no exterior ele estudava para concursos públicos e já havia trabalhado em uma academia, mas não se adequou ao emprego formal. “Desde criança fiz bazares com as minhas coisas e, na juventude, comecei a observar outros empresários, a fazer cursos e descobri que o meu perfil é de empreendedor, e não de funcionário”, relata.
Quando voltou ao Brasil, decidiu investir no negócio próprio. Tentou vender biquínis e saladas de frutas antes de encontrar o projeto ideal: a produção de açaí. Ele comercializa caixas com 12 unidades do produto em embalagens de plástico, pronto para o consumo. “Sou criativo e, quando trabalho para mim, consigo realizar as atividades com mais vontade e precisão”, justifica. O jovem empresário abriu a Cilindro Açaí em 2009 e há um ano inaugurou a primeira loja. A empresa produz cerca de 1 tonelada de açaí por mês e o faturamento varia de R$ 12 a R$ 15 mil.
Liberdade com limites
Alguns empreendedores são pessoas que, como Igor, não conseguiram se encaixar no mundo corporativo como empregados, ou por serem considerados insubordinados e quererem agir com mais liberdade ou por não se adequarem às normas e regras rígidas de algumas organizações. Essa aparente rebeldia pode ser sinal de que o seu lugar é, na verdade, à frente do próprio negócio. Os especialistas alertam, no entanto, que a simples vontade de largar o terno e a gravata e de não ter mais que responder a um chefe não é suficiente para deixar tudo e abrir um empresa.
“Diversos empreendedores foram funcionários durante vários anos e, porque compreenderam muito bem o mercado ou o processo de gestão, ficaram mais encorajados para empreender”, exemplifica Siegrid Guillaumon, professora da disciplina de empreendedorismo e inovação da Universidade Católica de Brasília (UCB). Siegrid não descarta que a liberdade plena é o sonho de todos e que isso é um dos componentes do perfil do empreendedor, mas é preciso ser cauteloso e ter em mente o ônus que essa decisão traz, incluindo uma responsabilidade maior sobre os resultados da empresa. “Temos estudos que revelam que o empreendedor trabalha, em média, 10 a 12 horas por dia, inclusive nos fins de semana, ou pelo menos seis dias na semana. O empreendedor não descansa. A diferença é que trabalha para ele. Quem trabalha para outra pessoa ou empresa, muitas vezes, não encontra sentido na tarefa, sente que está cumprindo uma função mecânica.”
Conhecimento
Abrir uma empresa dispensa um diploma de curso superior, o aprendizado pode vir da prática diária no empreendimento, mas as chances de errar são muito menores quando se tem os conhecimentos necessários para desenvolver as habilidades que todo empreendedor deve ter. Existem diversos cursos e eventos que reúnem dicas para quem já tem uma empresa ou para quem pretende abrir um negócio próprio, inclusive opções de MBA e pós-graduação e eventos, como a Feira de Negócios e Inovação, que ocorrerá em 14 de dezembro na Universidade de Brasília (UnB).
“Muitas vezes, a pessoa tem excelente espírito empreendedor, mas, por falta de capacitação, não consegue se desenvolver”, destaca Paulo Suarez, diretor do Centro de Desenvolvimento Tecnológico da UnB (CDT/UnB). E a preparação, alerta o especialista, precisa ser permanente, pois o mercado está em constante mudança. A regra vale para qualquer setor, até mesmo os mais tradicionais. “Essa capacitação pode ocorrer de diversas formas, desde um autodidata que procure leituras e informações dos mais diversos meios, até aquele que vai procurar curso de curta duração ou uma incubadora. O que não pode é a pessoa manter soluções que funcionavam no passado.”
A professora Siegrid Guillaumon explica que o curso superior mais adequado para empreendedores é o de administração, que ajudará a lidar com questões financeiras, jurídicas, trabalhistas e de planejamento, por exemplo. Essas graduações estão sendo procuradas tanto por jovens que querem aproveitar as oportunidades de empreendimentos virtuais quanto por pessoas mais experientes no mercado, que têm negócios consolidados.
Além da técnica
A empreendedora Bel Pesce, autora do livro A menina do Vale, usou a experiência adquirida ao abrir diversas startups para ensinar outros empreendedores. O novo projeto de Bel é uma escola de empreendedorismo que oferece cursos presenciais e on-line para preencher a lacuna entre o que se aprende na escola e o que o mercado realmente demanda, a FazINOVA — fazinova.com.br. “Eu acho interessante o empreendedor ter conhecimentos específicos, ainda mais se for fazer algo muito tecnológico, mas tenho reparado que as grandes habilidades que te ajudam a empreender são relacionadas ao lado comportamental: a habilidade de conseguir comunicar bem a visão tanto para hoje como para daqui a 10 anos, por exemplo. Elas são difíceis de se aprender em uma escola, tem que empreender mesmo.”
Fonte: Correioweb - Mariana Niederauer - Publicação: 24/11/2013
Notícia publicada em: 26/11/2013